segunda-feira, 9 de maio de 2011

O novo partido do táxi

por Filomena Martins (DN)



Para as eleições do próximo dia 5 de Junho parece haver para já apenas dois dados adquiridos: a Direita mais à direita do nosso sistema político vai crescer e a Esquerda mais à esquerda vai cair. Culpados? Paulo Portas e Francisco Louçã.

Apesar de esta tendência de crescimento da direita ser europeia, em Portugal tem particularidades muito específicas.Porque por cá, a um mês da ida a votos, essa multiplicação inexplicável de vitórias da Direita pelo mundo durante uma crise que é acusada de criar não beneficia o nosso maior partido dessa área, o maior partido da oposição, a natural alternativa de poder.

Num ano e meio com Passos Coelho na liderança, num ano e meio de quatro PEC que não chegaram, num ano e meio em que os mercados expuseram todas as ilusões que o Governo quis criar e todas as megalomanias em que afundou o País, num ano e meio em que Sócrates teve de dar o dito por não dito e pedir ajuda externa, o PSD foi ficando cada vez mais longe de poder cantar uma vitória que parecia certa. Sucessivos erros, alguns de inabilidade, mas a grande maioria de ingenuidade política e de incapacidade de responder com propostas claras à máquina da demagogia do PS, tornam estas eleições numa enorme incógnita.



As únicas certezas estão por isso nos extremos, que se afastam cada vez mais. Premiando o discurso elaborado e pensado de Portas e punindo a errância e a fuga ao comprometimento de Louçã.
Os democratas-cristãos, a que incompreensíveis sondagens não costumam dar mais que 5%, surgem agora com 10%. O que, fazendo as extrapolações com base nos últimos anos, pode valer uma votação histórica: a solidificação dos dois dígitos nos 12% a 15%. Com outra garantia: a não ser que a solução seja mesmo um governo de "bloco central", qualquer que seja o vencedor de dia 5 terá de contar com o CDS para formar Governo e com Portas para ministro dos Negócios Estrangeiros.

Porque Portas (ele e Sócrates são os únicos políticos portugueses verdadeiramente profissionais) tem sabido gerir como nenhum outro o discurso e estratégia face ao actual momento do País: apelando aos necessários acordos entre partidos e mostrando a disponibilidade para coligações, mas sem deixar de marcar as diferenças do seu CDS-PP em relação quer a PSD quer a PS; mostrando sentido de Estado em relação ao apoio às medidas da troika, mas sabendo distanciar-se; e até - último coelho da cartola - admitindo já a hipótese de se estar a preparar para um dia ser primeiro-ministro.


Em sentido contrário, os bloquistas seguem em queda livre. A moção extemporânea apenas para marcar território aos comunistas, primeiro, a repulsa em participar em soluções de governo com o PS, depois, e, finalmente, a recusa de diálogo com a troika fizeram mossa interna (as vozes de Rui Tavares, Daniel Oliveira e Ana Drago já se fizeram ouvir), e também externa, como mostram as mesmas sondagens. O que obrigou Louçã a cambalhotas sucessivas, que pioraram o que já era mau. Houve pedidos de mediáticos encontros com o PCP de Jerónimo, a admissão de que afinal governar já estará nos objectivos, e até a opção de fazer propostas à troika indirectamente através de Silva Pereira.

Este errante percurso desviará eleitores para o voto útil.

O Bloco arrisca, pois, trocar de papel com o CDS e tornar-se o novo partido do táxi.


A vingança de Teixeira


Teixeira dos Santos vingou-se.

Depois de ter sido obrigado a reaparecer, qual figura do Madame Tussauds, ao lado de Sócrates, exibido como uma prova viva do cansaço e do trabalho que deram conseguir o tal "tão bom acordo" com a troika; depois de ter sido obrigado a fazer o papel de profeta da desgraça, para a seguir ao Messias anunciar a verdadeira dimensão do aperto que aí vem, as que "não são boas notícias".

Depois de tanta estratégia combinada, como o próprio revelou, fez questão de deixar as coisas bem claras sobre o que o País viveu no último mês. Não só nunca desmentiu não ter sido ele a forçar o primeiro-ministro a pedir a ajuda externa com aquela surpreendente comunicação ao Jornal de Negócios como fez questão de dar razão ao FMI, UE e BCE, reafirmando que se a ajuda tivesse sido solicitada mais cedo a austeridade seria muito menor e menos dura. Touché!


Outras desigualdades

Portugal tem um parque automóvel invejado por toda a Europa. Tem um aeroporto renovado, com um fantástico design e uma luxuosa arquitectura de interiores, apesar de ser para demolir mal a crise se for embora. Tem estações de metro que são verdadeiros museus e exposições de arte. E tem também os mais bonitos e modernos McDonalds que conheço.

E ainda bem que tem tudo isto. O problema está no que não tem.

Porque um País que tem tudo o resto não pode ter aquilo que se viu nas televisões na última segunda-feira à noite. Centenas e centenas de pessoas (só vendo as imagens!) aglomeravam-se desde madrugada à porta do hospital dos Capuchos para conseguir senhas - raras! - que apenas duas vezes por ano - duas! - dão acesso a consultas de oftalmologia. Terceiro-mundista.

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