(José António Saraiva - SOL)
Por uma vez nesta crise política, Passos Coelho encontrou as palavras certas.
Na apresentação do programa eleitoral do seu partido, disse o que era preciso dizer.
Numa altura em que, do PS ao CDS, se fala disparatadamente em «compromisso», Passos Coelho disse que não quer ir para o Governo «a qualquer preço», que as eleições são uma «escolha», que para haver escolha é necessário haver «propostas diferentes» – e, finalmente, apresentou as suas próprias propostas.
Que podem arrumar-se em duas grandes categorias: pôr as contas do país em ordem e pôr a economia a crescer.
É claro que tanto uma coisa como outra são tarefas gigantescas – mas, para se atingir um objectivo, é preciso começar por enunciá-lo; caso contrário, jamais se alcançará.
PASSOS Coelho escolheu o caminho que sempre defendi: falar verdade aos portugueses.
Nestas eleições, algum partido teria de assumir corajosamente a ruptura e dizer ao país, cara a cara, quais as medidas que vai tomar para equilibrar as finanças.
E, aí, o país escolherá o caminho que prefere: fazer sacrifícios ou continuar a assobiar para o ar.
Marcelo Rebelo de Sousa classificou esta atitude como um «risco», dizendo ser difícil ganhar eleições com a franqueza revelada por Passos Coelho.
Ora eu digo o contrário: é inútil ganhar eleições não dizendo a verdade.
O país está num buraco – e precisa de saber que não sairá dele sem um grande esforço.
Dão-me vontade de rir aqueles que dizem: «Fizemos um bom acordo», como quem diz: «Não temos de fazer grandes sacrifícios».
Mas esta gente ainda não acordou?
Não percebe que sem sacrifícios não iremos a parte nenhuma?
E O ESTADO tem de dar o exemplo, emagrecendo e gastando menos.
Neste sentido, as propostas de Passos Coelho de redução do número de deputados e extinção dos governos civis, não representando uma excepcional poupança, são um bom sinal.
São sinal de que o Estado também está disposto a fazer dieta e a participar nos sacrifícios.
E os sinais que o Estado dá à sociedade são importantíssimos.
MAS quem fala de sacrifícios tem de ser capaz de transmitir, ao mesmo tempo, sinais de esperança.
Ninguém está disposto a sacrificar-se se não acreditar que o esperam dias melhores.
Foi isto que Manuela Ferreira Leite, com o seu perfil austero, não quis perceber – e é isto que Passos Coelho parece ter percebido.
O líder do PSD sabe que tem de prometer alguma coisa.
Não falsas promessas de menor austeridade.
Mas promessas de que é possível mudar o rumo da economia e pôr o país a crescer.
SÓCRATES e o PS acreditaram que poderiam fazê-lo através do Estado.
Daí a aposta nas ‘grandes obras’, que serviriam de motor.
Mas o dinheiro faltou e os projectos ficaram na gaveta.
O PSD aponta agora outra via, que está aliás de acordo com a sua matriz: apostar na sociedade civil, libertar a sociedade civil, dar asas à sociedade civil.
Defendo há muitos anos que a falta de dinamismo da sociedade civil e a sua dependência histórica do Estado é a primeira razão do nosso atraso.
Todos os países ricos têm sociedades civis fortes – e são elas as principais responsáveis pela criação de riqueza.
Por isso, acho que é este o caminho certo.
UMA palavra final para a afirmação de Passos Coelho de que não quer ser poder a qualquer preço.
Como o compreendo!
Não vale a pena integrar um Governo que não tenha condições para mudar – e um Governo onde estejam o PSD, o PS e o CDS, como muitos defendem, será um Governo tolhido por dentro, obrigado a compromissos constantes, sem capacidade de fazer as rupturas necessárias.
Ao contrário do que muitos dizem, será um Governo fraco e não um Governo forte – porque será atravessado por divisões e disputas insanáveis.
HÁ ALTURAS em que é preciso saber dizer ‘Não’.
E Passos Coelho disse-o claramente: se me quiserem e concordarem com estas propostas votem em mim, caso contrário passem bem.
Percebe-se que os socialistas estejam disponíveis para um Governo a três: isso corresponde ao seu desejo desesperado de não sair do poder.
Mas ninguém com juízo aceitará governar com a equipa que trouxe o país até aqui.
Portugal precisa de clareza e águas limpas – e não de empastelamento e águas turvas.
Portugal precisa de um Governo coeso e com uma liderança clara – e não de uma capoeira com três galos guerreando-se constantemente
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