sexta-feira, 13 de maio de 2011

O grande Elias



Os políticos, como os actores, centram a actividade na representação. A grande diferença é que, depois de terminarem a sua carreira, têm em geral sortes opostas. Enquanto as representações memoráveis dos grandes filmes vão ganhando fama à medida que o tempo passa, as ilusões dos políticos ficam mesquinhas com a distância.

Isso explica a grande distinção entre duas personalidades portuguesas de primeira linha que seguiram trajectórias paralelas na sua carreira. Porque, se virmos bem, o consulado do senhor Primeiro-Ministro José Sócrates (1957-...) acompanhou, passo a passo, as principais personagens da grande estrela do nosso cinema antigo, António Silva (1886-1971).





Na campanha eleitoral de 2005 e nos primeiros meses após tomar posse como chefe do Governo, Sócrates tomou a atitude digna e severa do alfaiate Caetano de A Canção de Lisboa (1933). Sempre muito imparcial e desinteressado, criticava o Vasquinho da Anatomia (na circunstância o Dr. Santana Lopes, antecessor no cargo) como cábula e estroina. Acima de tudo, estava indignado por ele namorar com a filha, a costureirinha Alice (o povo). Entretanto, com "a máxima imparcialidade" manipulava a seu favor o resultado da eleição da rainha das costureiras da Academia Recreativa Dr. Barbosa Girão: "então um bocado de hino, façam favor, sim?". De facto, as promessas solenes de nunca subir impostos foram logo renegadas, aumentando o IVA. Afinal tudo não passava de um truque para poder "comer o dinheiro às velhotas", as tias de Trás-os-Montes.

À medida que o tempo passava o senhor Primeiro-Ministro, genial comediante, mudou de pele e foi aparecendo como o senhor Anastásio de O Leão da Estrela (1947). Eterno optimista, fazia promessas inauditas: plano tecnológico, reforma da administração, saúde e educação, energias renováveis, tudo ia ser possível: "O Peyroteo chuta no Terreiro do Paço e mete golo no estádio do Lima." Além disso defendia os seus partidários com todo o fanatismo: "Se é leão é um homem de bem." Com ele a democracia ganhava novos cambiantes: "Eu trato o meu semelhante de igual para igual: o que é meu é meu, o que é teu é nosso."

Quando se começou a ver que as reformas afinal não aconteciam, e além disso os jornais descobriam escândalos sucessivos, houve nova mudança, desta vez para Simplício Costa de O Costa do Castelo (1943). Versejador, professor de fado, caloteiro sempre optimista, era imparável: "Quanto é que você aposta/que o povinho até se afasta,/quando vir passar o Costa/a correr com esta pasta?". Os seus planos e projectos eram como a da compra da telefonia de 300 escudos: "'Vendia-ma por 400. Eu dava-lhe 20 escudos semana sim, semana não. Na semana sim, que eu não pagaria, ficava para a semana não. Sim?' 'Não!'."

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