segunda-feira, 18 de outubro de 2010

sentido


(JN de hoje)

Não conheço ninguém que goste do Orçamento do Estado para 2011. Mais, não conheço ninguém que ache que este é um bom Orçamento. O drama começa logo entre quem o propõe: José Sócrates relembra, a cada passo, os apertos no coração ou as dores de alma que este Orçamento lhe provoca. Compreende-se, é a prova, preto no branco, que a prosperidade que nos andou a vender durante anos era uma fantasia descabelada. E confirma, se dúvidas houvesse, que os políticos, sobretudo quando estão no Poder, se transformam em gente incapaz de falar verdade.


O drama continua com quem tem de o aprovar, ou seja, os deputados. Não deve haver um único que acredite neste Orçamento. Sendo que os do PS limitar-se-ão a cumprir as ordens do chefe, com mais ou menos entusiasmo. O folhetim joga-se portanto no lado do PSD. É o único partido de oposição com verdadeiro poder de influenciar a decisão. E quase todos dizem que acabará por viabilizar a proposta, optando pela abstenção. Com isso perderá a pouca credibilidade que eventualmente lhe sobrava. Depois de meses a pregar contra o aumento de impostos, lá terá de aprovar o maior ataque fiscal de que há memória em Portugal. E a ser assim fica a curiosidade de saber que pedido de desculpas fará Passos Coelho desta vez.


O drama adensa-se quando se percebe que até "a última reserva do país" manifesta reservas quanto a este Orçamento. É sempre difícil perceber o que quer dizer Cavaco Silva, mas parece evidente que, quando manifesta esperança num "Orçamento eventualmente melhor", está a dizer-nos que o actual não é grande coisa.


Como é evidente, quem tem de pagar este Orçamento também não pode gostar dele. Os professores, polícias, juízes, médicos, resumindo, os funcionários públicos, não apreciaram o corte nos salários até 10%. A classe média trabalhadora, desde os remediados aos mais abastados, não aceita a rapina do Fisco sobre os seus salários. Os pensionistas mais pobres não apreciam piorar o seu já miserável poder de compra, os remediados não vêem com bons olhos a perda de qualidade de vida. As famílias mais pobres não podem aplaudir o fim do abono de família, as reduções no Rendimento Social de Inserção, as restrições ao subsídio de desemprego, sobretudo quando sabem que faltarão aos seus filhos as migalhas que até aqui permitiam sobreviver.


Repito, não há ninguém que goste deste Orçamento, ninguém que o considere um bom Orçamento. Todos reconhecem que o país ficará mais pobre, que vem aí mais uma recessão e, com ela, ainda mais pobreza, mais impostos, mais recessão, e outra vez mais pobreza, num ciclo infernal sem fim. Mas ao mesmo tempo insistem os políticos no poder que temos de engolir, de aceitar, de aprovar o Orçamento. Porque é preciso dar um sinal ao mercado, ou seja, aos que especulam com o dinheiro. Mas que sentido é que isto faz?

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