sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Polpa de tomate e não sei quantos milhões




 
 
 
 
 
O tratamento que alguns meios de comunicação social dão às notícias, mudando o tom consoante o(s) visado(s) é, no mínimo, surreal. Ricardo Salgado é provavelmente a única pessoa cujo primeiro nome é Doutor. Mas adiante.
 
 
 
Dr. Ricardo Salgado

Segundo li em diversos jornais, que destacaram uma noticia veiculada no jornal i, o
 
"Dr. Ricardo Salgado esqueceu-se de declarar 8,5 milhões de euros".
 
"Esqueceu-se" - dizem.
 
Ora, não fosse Ricardo do Espírito Santo Silva Salgado precisamente o "Dr. Ricardo Salgado", todo-poderoso do mundo financeiro, fosse ele o Zé Mário - proprietário de uma retrosaria nos Anjos com sucursal em Luanda, que adora patchwork e economia paralela - e estou em crer que o título andaria à volta disto: "Zé Mário das lãs com o fisco à perna por causa de enchimento e manta acrílica não declarados", ou ainda qualquer coisa mais apelativa: "Vendas de velcro no valor de 8500 euros tramam Zé Mário".

Provavelmente o Zé Mário estava sujeito a ir preso por não ter dinheiro para pagar os milhares de euros em multas. E ao que parece este governo pretende prender tudo o que mexe por meia dúzia de tostões. Mas tratando-se de milhões de euros não declarados, algures perdidos no estrangeiro, a pessoa arrisca-se a ser condecorada.
 
Para o Dr. Ricardo Salgado, primeiro-ministro não executivo deste país, o título dos jornais foi uma espécie de pedido de desculpas.
 
"Dr. Ricardo, pedimos perdão mas temos de dizer qualquer coisinha. Estas coisas acontecem a todos. Os leitores vão entender, até porque vão identificar-se de alguma forma com o sucedido."

E é verdade.
 
Há poucos dias andava tão desorientado no supermercado, à procura de amaciador da roupa, que me esqueci completamente do pão alentejano.
 
Não foi intencional.
 
E tenho a certeza de que o "esquecimento" do Dr. Ricardo se trata de uma situação idêntica.
 
Uma distração.
 
Uma ida ao mecânico para mudar os pneus ao Bentley, a seguir ao golfe, e, quando já ia a caminho de casa para preencher a papelada das finanças, liga a Maria João a pedir com urgência polpa de tomate e louro porque a Creusa tinha uma perna de peru à napolitana à espera de ingredientes.
 
Com isto tudo, esqueceu-se de declarar os 8,5 milhões de euros em moedas que tinha no porta-luvas para dar aos arrumadores. Só os descobriu mais tarde, quando remexia o carro à procura do cartão do Jumbo.
 
Mas calma, está tudo pago e regularizado.
 
Quem sabe, sabe, e o BES é que sabe.

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