quarta-feira, 6 de março de 2013

Crónica sobre a moral


 


BAPTISTA-BASTOS
(Baptista-Bastos - DN de hoje)

O banqueiro Filipe Pinhal, e um vistoso grupo de "quadros" superiores, resolveram associar-se num objectivo protestatário, e criar os Reformados Indignados.

Filipe Pinhal diz que acusação da CMVM será "determinante" para a sua defesa no caso BCP

Pinhal recebe, mensalmente, o equivalente a 14 mil contos (moeda antiga) correspondente aos descontos de que diz ter sido esportulado durante uma vida de trabalho insano e muito fatigante. Parece que lhe querem "extorquir", continua ele, uma fatia grossa do rédito. Disse, também, que não foi à manifestação de 2 de Março "porque tinha outros compromissos". De contrário, certamente, veríamos o banqueiro, senão de punho vertical, pelo menos a cantar a Grândola, vila morena.

Creio que a reforma de Filipe Pinhal está nos ajustes: ele descontou, é justificado que lhe "restituam" o que despendeu. Tudo legal. Porém, a ferida está na imoralidade do caso, espelho restituído da sórdida imoralidade quase generalizada. Para auferir uma reforma daquele montante, o vencimento que recebia, além dos prémios, das "surdas", das mordomias várias, já de si era absolutamente imoral, tendo em conta os ordenados da maioria dos portugueses. Lembro que o comendador Joe Berardo, criticou, em assembleias do BCP, de que Pinhal era administrador, os "obscenos vencimentos do conselho de administração".



Dir-se-á: isso é lá com eles. Não é; também é connosco, porque o facto, extremamente deplorável, pertence à circunstância portuguesa, confrontada não só com a problemática social como à dúvida e à decepção permanentes de milhões de nós.





A nossa experiência democrática tem sido fértil nestas deformidades. O descaso, tido como "normal", e a abandonada resignação de um povo que deixou de acreditar na equidade e na justiça, porque vê os corruptos impunes e os jogos de poder a duas mãos, atiraram-nos, novamente, para a tradicional apagada e vil tristeza. O princípio da regulação e da harmonização entre os indivíduos explica o funcionamento social e estabelece os fundamentos de uma ética, inerente à dimensão do humano. Os exemplos procedentes de quem os devia dar estão encarquilhados porque fundados numa forma de reflexão assente no cifrão e na cifra. Se aquele Ulrich, católico e bom chefe de família, disse o que disse, com despudor e afronta, fê-lo por se sentir resguardado pelo ar do tempo e pelas condições políticas que lhe são propícias.



A imoralidade cria os seus peculiares padrões e os seus estipendiados serventuários.

Quando um banqueiro, outro banqueiro!, o elegante e garboso João Salgueiro



(conhecido entre os seus pares por "aquele que tem mais olhos do que barriga"), se pergunta, admiradíssimo, porque é que os desempregados não vão limpar as matas, as coisas podem não ficar mais claras, mas ficamos a saber, com nitidez, a natureza das estruturas mentais e a extensão ética dos que pretendem constituir - a nossa "elite."

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