sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Tão amigos que nós vamos continuar a ser





Na vacuidade dos discursos diplomáticos encontram-se muitas subtilezas. A mais sui generis reside talvez na destreza com que os diplomatas transformam o mau no aceitável e o duvidoso no bom. A chamada "real politik" económica é, nesse particular, paradigmática de como os chamados valores essenciais são facilmente atirados para as calendas, a bem das relações bilaterais, dos negócios frutuosos, das recepções nas embaixadas coroadas a vinho francês e salgadinhos coloridos.


A revolta no Médio Oriente a que vamos assistindo por estes dias, e a forma como a União Europeia e os Estados Unidos demoraram a acordar para a realidade, ilustra na perfeição o engajamento dos estados face a poderes não-democráticos, em muitos casos corruptos, na maioria desrespeitosos dos Direitos Humanos.


Em Portugal, e, de uma forma geral, no Mundo ocidental, a classe política vai protagonizando sessões públicas de contorcionismo. Quase todos têm telhados de vidro. Sócrates (que, em 2007, durante uma visita de Kadafi a Portugal, lhe enalteceu as suas "visões estratégicas" e a sua "sabedoria"), Berlusconi, Merkel, passando pelos vários líderes norte-americanos.


Todos padecem do mesmo mal e fatalidade: são coniventes com as práticas de regimes que - queremos crer - não toleram apenas porque a inevitável diplomacia económica o determina. Para os chefes de Estado e de Governo do Mundo democrático, as lideranças autocráticas vão oscilando entre o repúdio e o fascínio. Com vantagem clara para o último. Já para não falar dos bancos suíços, tão afoitos a zelar pelas fortunas de sangue desses tiranetes e tão diligentes a congelar-lhes as contas quando estoura a borrasca.


Ora, não é crível que algo mude com esta sublevação popular. A estratégia calculista dos estados manter-se-á, na exacta proporção da sua dependência do petróleo. Sobre isto, Basílio Horta, o homem que lidera o investimento português no estrangeiro, foi cristalino: a aposta no Médio Oriente é para durar, independentemente de quem sejam os insanos que governem o território.


A corrida, agora, é entre os estados que não querem chegar atrasados ao futuro desses países que tombam. Com ditadores ou sem eles, o petróleo continuará a brotar do subsolo. E, uns bons metros acima, vai ser preciso reconstruir as estradas e os edifícios.

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