Passou agora mesmo na SIC, neste Dia de Todos os Santos, um documentário sobre os mortos portugueses da chamada guerra colonial, nas circunstâncias em Mueda, Moçambique.
E lembrei-me das guerras, desde sempre, em que o general bem protegido envia alegremente os soldadinhos para a morte.
E lembrei-me de, agora, uns quantos políticos, também bem protegidos, mandarem alegremente para a miséria milhares, senão milhões, de portugueses. Impunemente. Até aplaudidos por fanáticos correligionários. Para quem o que importa é a cor do cartão partidário. Os outros que se lixem.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
Cultura da mentira
(JN)
José Sócrates mentiu-nos, mais uma vez. É a principal conclusão que se retira desta novela negocial em torno do Orçamento. Uma acusação leviana? Sugiro um esforço de memória. Recordo, em particular, uma das frases lapidares com que o primeiro-ministro justificou o ataque fiscal aos portugueses, a 29 de Setembro passado, no final da reunião do Conselho de Ministros: "São medidas que só se tomam quando não há alternativa". Continuando, Sócrates acabara de anunciar medidas como a taxa de IVA nos 23%; corte de 5% nos salários dos funcionários públicos; congelamento de pensões; fim do abono de família; aumento encapotado do IRS, penalizando as deduções fiscais.
Nobas opurtonidades
A NÃO PERDER...
"A educação, objecto de tanto palavrório, passa moeda falsa: promete o mundo e não dá saber e trabalho" - Vasco Pulido Valente.
Do Caderno do Público, “O Inimigo Público” (n.º 369, 29.Out.2010), transcrevo, na íntegra, este saboroso e suculento naco de prosa, intitulado “Estudo revela que 1 em cada 3 adultos está satisfeito por ter frequentado o programa Novas Oportunidades porque passaram a entender muito melhor a carta de despedimento”:
“Segundo a Universidade Católica, 1 em cada 3 alunos das Novas Oportunidades considera que o programa foi positivo na sua vida profissional, uma vez que passaram a entender porque foram despedidos, enquanto antes achavam que ‘justa causa’ era um programa sobre advogados da Fox.
‘Se ainda fosse ignorante estaria optimista e pensaria, baseando-me nos ditados populares, que ‘depois da tempestade vem a bonança’. Mas, como agora estou dotado de qualificações literárias e valências pedagógicas, concluí analiticamente que nunca mais vou encontrar emprego na vida. Obrigado, Novas Oportunidades!, explicou um português de 45 anos de idade. VE”.
Regressando, uma vez mais, a Eça, meu escritor de declarada eleição e profunda estima, da prosa queirosiana transcrevo: “O riso é a mais antiga e ainda mais terrível forma de crítica. Passe-se sete vezes uma gargalhada em volta de uma instituição, e a instituição alui-se; é a Bíblia que no-lo ensina sob a alegoria geralmente estimada, das trombetas de Josué, em torno de Jericó”. A quantas gargalhadas mais da opinião pública, que soam a anunciar a sua desgraça e o seu logro, resistirão as estivais muralhas de areia de praia das Novas Oportunidades ?
Rui Baptista, in De Rerum Natura
"A educação, objecto de tanto palavrório, passa moeda falsa: promete o mundo e não dá saber e trabalho" - Vasco Pulido Valente.
Do Caderno do Público, “O Inimigo Público” (n.º 369, 29.Out.2010), transcrevo, na íntegra, este saboroso e suculento naco de prosa, intitulado “Estudo revela que 1 em cada 3 adultos está satisfeito por ter frequentado o programa Novas Oportunidades porque passaram a entender muito melhor a carta de despedimento”:
“Segundo a Universidade Católica, 1 em cada 3 alunos das Novas Oportunidades considera que o programa foi positivo na sua vida profissional, uma vez que passaram a entender porque foram despedidos, enquanto antes achavam que ‘justa causa’ era um programa sobre advogados da Fox.
‘Se ainda fosse ignorante estaria optimista e pensaria, baseando-me nos ditados populares, que ‘depois da tempestade vem a bonança’. Mas, como agora estou dotado de qualificações literárias e valências pedagógicas, concluí analiticamente que nunca mais vou encontrar emprego na vida. Obrigado, Novas Oportunidades!, explicou um português de 45 anos de idade. VE”.
Regressando, uma vez mais, a Eça, meu escritor de declarada eleição e profunda estima, da prosa queirosiana transcrevo: “O riso é a mais antiga e ainda mais terrível forma de crítica. Passe-se sete vezes uma gargalhada em volta de uma instituição, e a instituição alui-se; é a Bíblia que no-lo ensina sob a alegoria geralmente estimada, das trombetas de Josué, em torno de Jericó”. A quantas gargalhadas mais da opinião pública, que soam a anunciar a sua desgraça e o seu logro, resistirão as estivais muralhas de areia de praia das Novas Oportunidades ?
Rui Baptista, in De Rerum Natura
domingo, 31 de outubro de 2010
A Ti Maria
Encontrei a Ti Maria à vinda da missa. Chovia a potes. Quer boleia Ti Maria. Não. A água da chuva refresca as ideias. E que ideias são essas Ti Maria. Ah. Zé. Tens estado onde, rapaz. Até gosto que me chamem rapaz. Diga lá, Ti Maria.
-Fomos gozados, Zé. Os cabrões (sic) do PS e do PSD (ó Ti Maria, olhe que veio agora da missa!) andaram a fazer de conta que negociavam. Para chegarem ao ponto final. É uma comédia que o nosso grupo de teatro do Centro de Dia, o dos velhotes, faria muuuuuito melhor!
Ó Ti Maria, mas o orçamento não tinha que vir a ser aprovado?
-Estás muito verde, Zé. Ainda tens que comer muito caldo. Este orçamento é para quê? Os gajos da televisão só falam que se o orçamento não for aprovado, ninguém nos empresta dinheiro. Mas que é isto? Orçamentos para ficarmos ainda a dever mais dinheiro?!
Tem razão, Ti Maria. Vou-me ao cozido. E ao caldo. Hoje é Domingo, Ti Maria.
-Fomos gozados, Zé. Os cabrões (sic) do PS e do PSD (ó Ti Maria, olhe que veio agora da missa!) andaram a fazer de conta que negociavam. Para chegarem ao ponto final. É uma comédia que o nosso grupo de teatro do Centro de Dia, o dos velhotes, faria muuuuuito melhor!
Ó Ti Maria, mas o orçamento não tinha que vir a ser aprovado?
-Estás muito verde, Zé. Ainda tens que comer muito caldo. Este orçamento é para quê? Os gajos da televisão só falam que se o orçamento não for aprovado, ninguém nos empresta dinheiro. Mas que é isto? Orçamentos para ficarmos ainda a dever mais dinheiro?!
Tem razão, Ti Maria. Vou-me ao cozido. E ao caldo. Hoje é Domingo, Ti Maria.
sábado, 30 de outubro de 2010
O sonho
J. L. Pio de Abreu, no "Destak"
Nos anos 80 sonhava-se com o futuro. Sonhava-se que a ciência iria resolver os problemas humanos, a fome seria suprimida e a automação iria substituir o trabalho mais pesado, permitindo uma maior justiça social. Energia e software eram quanto precisávamos para obter os nossos recursos. O trabalho humano seria menos necessário, e os produtos resultantes da automação seriam cada vez mais baratos.
Para manter o pleno emprego, o horário de trabalho seria reduzido e a reforma viria mais cedo. Como as pessoas viveriam mais tempo, elas podiam, a partir de certa altura, encetar uma nova vida e dispor de mais tempo para o convívio e educação dos mais novos. Haveria mais produção artística e intelectual e inovadora que resultaria do gosto de criar, o que se faria por opção. Na verdade, já estávamos nesse caminho.
Desde então, existiram imensos progressos da genética, da engenharia, da energética e da informática que facilitariam o sonho. A automação aumentou, os seus produtos embarateceram, apareceram as energias renováveis e o software não pára de substituir o trabalho humano, cada vez menos necessário. Mas aumentaram as exigências e o horário de trabalho, bem como a idade da reforma, à custa de um desemprego cada vez maior.
Temos hoje melhores condições para cumprir o sonho, no entanto caminhamos no sentido inverso, em direcção ao pesadelo. Nos anos 80 sonhava-se porque não se tinha previsto que o lucro fosse o valor supremo dos anos que a seguir viriam.
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Eu sonhava nos anos 80… O murro que apanho agora é, por isso, muito doloroso
Zé da Silva
Os corpos do delito
Não tenho por costume folhetinizar em episódios estas crónicas (como o taoista, chamo-lhes assim porque não sei que nome têm e posto que tenho que chamar-lhes alguma coisa), mas as declarações do "porta-voz oficial da PSP" ao DN acerca da detenção de quatro raparigas e um rapaz da JCP que pintavam um mural na Rotunda das Olaias, em Lisboa, talvez justifiquem, na sua exemplaridade novilinguística, uma excepção.
(Gaugin)
A PSP considera naturalíssimo e "decorre[nte] das medidas cautelares de polícia" que duas das jovens detidas (menores, tudo o indica) tenham sido obrigadas a despir-se completamente na esquadra. Porque tudo terá tido, pelos vistos, a maior pureza de propósitos: fazer-lhes uma "revista sumária" (imagine-se o que será uma "revista completa") à procura de "armas, de fogo ou brancas" ou "produtos cujo transporte pode ser considerado crime, nomeadamente drogas".
Dir-se-ia, pois, que é rotina da PSP, de modo a pôr a nu todas as suspeitas possíveis sobre comuns cidadãos "conduzidos à esquadra", pedir-lhes o BI e mandá-los logo pôr-se em pelota. Talvez seja, mas, a crer no que se passou, será só com jovens raparigas, já que, no caso, os agentes se dispensaram de qualquer actividade por assim dizer investigatória no corpo do rapaz. Aparentemente, nem as mochilas do grupo terão sido revistadas. Só os corpos das jovens.
Há-de ter havido um bom motivo para isso. Talvez até mais do que um.
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
A quem serve o interesse nacional?
(por BAPTISTA-BASTOS , no DN)
A expressão "interesse nacional", muito em voga nos últimos tempos, é recuperada do discurso que marcou os anos salazaristas.
Acontece que Salazar escrevia bem e assimilava melhor, leitor com mão profusa do Padre Vieira, o que melhora o estilo e ajuda os labirintos da metáfora.
Os senhores que se servem, agora, da locução, nada sabem de metáforas, de Vieira, e muito menos das inclusões que tal alusão comporta e envolve. E, involuntariamente, são netos de Salazar. A árvore da língua exige a consciência de a saber afeiçoar às circunstâncias, neste caso políticas. A articulada ignorância que demonstram causa um cansaço interminável a quem é medianamente letrado.
Em nome do "interesse nacional", duas vistosas delegações (do PS e do PSD), procuram, no sigilo de enternecedoras conversas, salvar a pátria da derrocada. Os drs. Teixeira dos Santos e Eduardo Catroga são criaturas estimáveis. Em épocas diferentes já tentaram dar sentido à vida portuguesa, e contribuir para a nossa felicidade, mas, lamentavelmente, tudo piorou depois das suas influências.
Sempre em nome do "interesse nacional", têm mantido o statu quo, de que são crias e guardiães. As preocupações de ambos nada têm a ver com a renovação do presente. As reuniões apenas tentam dirimir a questão do poder. O conceito de "interesse nacional", na acepção mais nobre, implica a regulação dos laços sociais, e a capacidade de reformulação do sistema, a fim de se definir o que deve ser realizado. De contrário, [O "interesse nacional" ] é um conceito abstracto, porque dele é expulsa a população, permanentemente desrespeitada nos seus direitos e espoliada das suas prerrogativas fundamentais.
O "interesse nacional" corresponde ao interesse de uma minoria, cuja natureza de classe (não receemos a noção) invadiu tanto o campo privado como o público.
Não há identificação possível entre o tão declamado "interesse nacional" e aquilo que, directamente, diz respeito a todos nós. Nós pertencemos a outra história. À daqueles que pagam a factura pelos crimes que outros, impunemente, cometeram.
Não sei muito bem qual o "interesse nacional" que os representantes dos dois partidos em conclave estão a defender, a preservar, a resguardar. A hegemonia do PS e do PSD é balizada por um conservadorismo absolutamente imoral porque gerador das mais atrozes desigualdades.
Os drs. Catroga e Teixeira dos Santos não estão ali para reforçar o vínculo social dos portugueses, para melhorar a nossa vida. Estão ali com sentimentos de pacotilha, combinados na ideologia dominante, e cujos resultados estarão sempre esvaziados de substância, pelo carácter dos objectivos visados: manter o sistema a todo o custo. Sabemos o preço desse custo e a índole desse sistema
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Preocupações sociais
(JN de hoje)
Algo que me enternece (falta-me melhor palavra para identificar sentimento tão confuso) são as preocupações sociais do nosso patronato.
As empresas portuguesas constituem, com efeito, um capítulo à parte na teoria económica capitalista pois que, a crer nas declarações públicas dos nossos empresários, o que os move é sempre a criação de postos de trabalho e não o lucro (só que, para criar postos de trabalho, se vêem obrigados a ter lucro).
Portugal tem, ao lado de um Estado Social, um Empresariado Social, facto que justifica que, ao mesmo tempo que reclamam "menos Estado", os empresários portugueses peçam ao Estado tantos subsídios, apoios, isenções e benefícios fiscais.
Veja-se o recente e exemplar caso do patronato farmacêutico. O Governo baixou o preço dos medicamentos em 6% e isso gerou "muita apreensão" na Apifarma pois "1500 a 2000 postos de trabalho poderão estar em causa" (também "poderão estar em causa" uns milhões de euros de lucros, mas isso é, obviamente, secundário).
Já no que toca ao facto de o preço dos medicamentos deixar de constar das embalagens, a Apifarma concorda. "Estamos a falar de pôr etiquetas em embalagens que estão em armazéns, em paletes, e estamos a falar de desmontar paletes, embalagem por embalagem, para andar a colar etiquetas. Era um trabalho de loucos", diz o seu presidente. Não lhe ocorreu é que isso poderia criar "1500 a 2000 postos de trabalho".
Haverá Cojones?
(Paulo Guinote)
Porque a verdade é que o FMI não entra pela porta dentro sem a autorização interna.
Porque a verdade é que as instituições internacionais não têm assim tanto interesse numa bancarrota que lhes faria perder os créditos.
Porque vejo preocupados com o chumbo do OE principalmente muitos daqueles que podemos associar aos piores negócios do Estado, bastando para isso ler o livro de Carlos Moreno.
Porque há que, de uma vez por todas, perceber se Sócrates os tem no sítio para levar as ameaças até ao fim, ou se alguém os tem mais mais fortes e aguenta a parada
Porque a verdade é que o FMI não entra pela porta dentro sem a autorização interna.
Porque a verdade é que as instituições internacionais não têm assim tanto interesse numa bancarrota que lhes faria perder os créditos.
Porque vejo preocupados com o chumbo do OE principalmente muitos daqueles que podemos associar aos piores negócios do Estado, bastando para isso ler o livro de Carlos Moreno.
Porque há que, de uma vez por todas, perceber se Sócrates os tem no sítio para levar as ameaças até ao fim, ou se alguém os tem mais mais fortes e aguenta a parada
terça-feira, 26 de outubro de 2010
E depois dos professores...
"Juízes em fim de carreira ganham 4,2 vezes acima da média"
"Magistrados acusam Governo de manipular relatório"
A estratégia é exactamente a mesma: fornecer dados para um estudo internacional e acusar uma classe profissional de ganhar muito e trabalhar pouco para a manchar perante a opinião pública.
A principal vantagem dos juízes é que são elementos de um órgão de soberania e têm formas muito mais eficazes de fazer valer os seus direitos. Menos espampanantes, nem precisando de vir para a rua.
Mas a estratégia comunicacional do Governo é a mesma.
Paulo Guinote
"Magistrados acusam Governo de manipular relatório"
A estratégia é exactamente a mesma: fornecer dados para um estudo internacional e acusar uma classe profissional de ganhar muito e trabalhar pouco para a manchar perante a opinião pública.
A principal vantagem dos juízes é que são elementos de um órgão de soberania e têm formas muito mais eficazes de fazer valer os seus direitos. Menos espampanantes, nem precisando de vir para a rua.
Mas a estratégia comunicacional do Governo é a mesma.
Paulo Guinote
A propósito de uma entrevista de Luís Capucha
Excertos dos comentários de Helena Damião
(Blogue De Rerum Natura)
Luís Capucha é director da Agência Nacional para a Qualificação, “criada para acolher a Iniciativa Novas Oportunidades (INO) e o ensino profissional e artístico especializado”.
Devo dizer que encontro nessa entrevista indícios muito preocupantes de total ausência de atitude científica, que sistematicamente tem vindo ao de cima por parte de quem tem responsabilidades na educação formal.
Dou os seguintes exemplos:
1. Em vez de se encararem as críticas ou, pelo menos, algumas delas como uma possibilidade de análise e de correcção de eventuais erros, descredibiliza-se, menoriza-se, acusa-se, calunia-se quem as faz.
Bárbara Wong: "a opinião publicada tem colocado reservas à INO. Muitos dizem que esta só serve para dar diplomas. É assim?”
Luís Capucha: "Surgem críticas, mentiras e afirmações de quem não quer mentir mas fala do que não sabe".
Quem critica só pode, pois, ser mentiroso. E se não for mentiroso será ignorante!
Bárbara Wong: "Porque é que não se fez antes esta mudança?"
Luís Capucha: "A democratização de acesso implica verdadeira abertura social e de mobilidade, o que cria pressão junto de determinadas elites que não deixaram de reagir. Há uma democratização mal tolerada do acesso aos diplomas escolares".
Quem critica é, portanto, necessariamente, preconceituoso e anti-democrata...
2. Em vez de se esclarecem dúvidas que se colocam a quem está de fora, mas que legitimamente quer conhecer e compreender, recorre-se a arrazoados a redundâncias que nada esclarecem, antes confundem... ainda mais.
Bárbara Wong: “uma das críticas é que os adultos não aprendem disciplinas formais”,
Luís Capucha: “Desminto. Há regras a cumprir que têm a ver com o cumprimento dos procedimentos necessários.”
Se “há regras a cumprir”, que regras são essas que não podem ser claramente referidas?... Se "têm a ver com o cumprimento dos procedimentos necessários”, que procedimentos são esses, que não podem ser enunciados?
3. Em vez de se sistematizarem racional e objectivamente argumentos, recorre-se a crenças, a convicções individuais ou colectivas (não, isso não é filosofia da educação!).
Bárbara Wong: "Nessa velocidade não se perde qualidade?",
Luís Capucha: "O primeiro pilar da qualidade é a quantidade. Digo-o com toda a convicção. Sabemos que alunos de determinadas vias de ensino aprendem a fazer exames e a tirar notas, mas não sabemos se sabem alguma coisa quando acabam."
4. Em vez de se recorrer a conhecimento pedagógico sólido e aos meios que faculta ao ensino, à formação, à aprendizagem... recorre-se a sensibilidades de mercado e a opiniões que, acresce, serem opiniões em causa própria.
Bárbara Wong: "no processo de RVCC, as pessoas são avaliadas pelo que sabem e não pelo que aprenderam. Concorda?",
Luís Capucha: "Há dois grandes indicadores que mostram que as pessoas saem mais capacitadas, preparadas para os desafios: a adesão das empresas à INO e os testemunhos das pessoas".
Nenhum conhecimento digno de crédito [de qualquer área] nos permite afirmar com toda a certeza, sem qualquer margem para dúvidas, que os resultados académicos obtidos pelos alunos e, em sequência, os diplomas que recebem, correspondem directa, linear e integralmente ao que se pretendia que aprendessem.
Quem estudou minimamente estes assuntos saberá que certas linhas de investigação pedagógica têm, desde o início do século XX, trabalhado de maneira exemplar no assunto, o que se tem traduzido em princípios e técnicas de avaliação que, uma vez usadas correctamente, permitem obter uma maior aproximação entre o que se se pretende ensinar e o que os alunos revelam do que aprenderam.
Assim, não se pode afirmar que: "Os alunos quando obtêm um diploma, esse corresponde às competências que têm. Existem referenciais que estabelecem as áreas de competências que têm que ser possuídas e toda a avaliação de conhecimentos e os júris de certificação garantem que as pessoas possuem essas competências (...) as competências certificadas correspondem às possuídas".
Porém, esta afirmação peremptória foi feita por alguém que, além de ter ao que parece formação pedagógica, assume responsabilidades educativas assaz relevantes a nível nacional. Trata-se de uma afirmação tanto mais estranha quanto é certo que o conceito de competência é vagamente definido e diversamente entendido, mesmo pelos seus mentores.
Mais baralhados ficamos quando esse alguém declara que, afinal, nem valoriza sobremaneira os diplomas escolares. Pelo menos é o que se depreende quando numa postura dubitativa refere: "Há um factor social muito forte que tem a ver com o valor dos diplomas escolares. São muito valorizados."
Entrevista completa em:
http://www.publico.pt/Educa%C3%A7%C3%A3o/nao-ha-uma-especie-de-oferta-de-brindes-para-as-pessoas-virem-para-as-novas-oportunidades_1462412
(Blogue De Rerum Natura)
Luís Capucha é director da Agência Nacional para a Qualificação, “criada para acolher a Iniciativa Novas Oportunidades (INO) e o ensino profissional e artístico especializado”.
Devo dizer que encontro nessa entrevista indícios muito preocupantes de total ausência de atitude científica, que sistematicamente tem vindo ao de cima por parte de quem tem responsabilidades na educação formal.
Dou os seguintes exemplos:
1. Em vez de se encararem as críticas ou, pelo menos, algumas delas como uma possibilidade de análise e de correcção de eventuais erros, descredibiliza-se, menoriza-se, acusa-se, calunia-se quem as faz.
Bárbara Wong: "a opinião publicada tem colocado reservas à INO. Muitos dizem que esta só serve para dar diplomas. É assim?”
Luís Capucha: "Surgem críticas, mentiras e afirmações de quem não quer mentir mas fala do que não sabe".
Quem critica só pode, pois, ser mentiroso. E se não for mentiroso será ignorante!
Bárbara Wong: "Porque é que não se fez antes esta mudança?"
Luís Capucha: "A democratização de acesso implica verdadeira abertura social e de mobilidade, o que cria pressão junto de determinadas elites que não deixaram de reagir. Há uma democratização mal tolerada do acesso aos diplomas escolares".
Quem critica é, portanto, necessariamente, preconceituoso e anti-democrata...
2. Em vez de se esclarecem dúvidas que se colocam a quem está de fora, mas que legitimamente quer conhecer e compreender, recorre-se a arrazoados a redundâncias que nada esclarecem, antes confundem... ainda mais.
Bárbara Wong: “uma das críticas é que os adultos não aprendem disciplinas formais”,
Luís Capucha: “Desminto. Há regras a cumprir que têm a ver com o cumprimento dos procedimentos necessários.”
Se “há regras a cumprir”, que regras são essas que não podem ser claramente referidas?... Se "têm a ver com o cumprimento dos procedimentos necessários”, que procedimentos são esses, que não podem ser enunciados?
3. Em vez de se sistematizarem racional e objectivamente argumentos, recorre-se a crenças, a convicções individuais ou colectivas (não, isso não é filosofia da educação!).
Bárbara Wong: "Nessa velocidade não se perde qualidade?",
Luís Capucha: "O primeiro pilar da qualidade é a quantidade. Digo-o com toda a convicção. Sabemos que alunos de determinadas vias de ensino aprendem a fazer exames e a tirar notas, mas não sabemos se sabem alguma coisa quando acabam."
4. Em vez de se recorrer a conhecimento pedagógico sólido e aos meios que faculta ao ensino, à formação, à aprendizagem... recorre-se a sensibilidades de mercado e a opiniões que, acresce, serem opiniões em causa própria.
Bárbara Wong: "no processo de RVCC, as pessoas são avaliadas pelo que sabem e não pelo que aprenderam. Concorda?",
Luís Capucha: "Há dois grandes indicadores que mostram que as pessoas saem mais capacitadas, preparadas para os desafios: a adesão das empresas à INO e os testemunhos das pessoas".
Nenhum conhecimento digno de crédito [de qualquer área] nos permite afirmar com toda a certeza, sem qualquer margem para dúvidas, que os resultados académicos obtidos pelos alunos e, em sequência, os diplomas que recebem, correspondem directa, linear e integralmente ao que se pretendia que aprendessem.
Quem estudou minimamente estes assuntos saberá que certas linhas de investigação pedagógica têm, desde o início do século XX, trabalhado de maneira exemplar no assunto, o que se tem traduzido em princípios e técnicas de avaliação que, uma vez usadas correctamente, permitem obter uma maior aproximação entre o que se se pretende ensinar e o que os alunos revelam do que aprenderam.
Assim, não se pode afirmar que: "Os alunos quando obtêm um diploma, esse corresponde às competências que têm. Existem referenciais que estabelecem as áreas de competências que têm que ser possuídas e toda a avaliação de conhecimentos e os júris de certificação garantem que as pessoas possuem essas competências (...) as competências certificadas correspondem às possuídas".
Porém, esta afirmação peremptória foi feita por alguém que, além de ter ao que parece formação pedagógica, assume responsabilidades educativas assaz relevantes a nível nacional. Trata-se de uma afirmação tanto mais estranha quanto é certo que o conceito de competência é vagamente definido e diversamente entendido, mesmo pelos seus mentores.
Mais baralhados ficamos quando esse alguém declara que, afinal, nem valoriza sobremaneira os diplomas escolares. Pelo menos é o que se depreende quando numa postura dubitativa refere: "Há um factor social muito forte que tem a ver com o valor dos diplomas escolares. São muito valorizados."
Entrevista completa em:
http://www.publico.pt/Educa%C3%A7%C3%A3o/nao-ha-uma-especie-de-oferta-de-brindes-para-as-pessoas-virem-para-as-novas-oportunidades_1462412
Torpor
Só me ocorre uma palavra para descrever a não reacção da população portuguesa perante o assalto fiscal que está anunciado (os dois principais partidos estão praticamente só a negociar o IVA do leite achocolatado) para já não falar dos cortes salariais, em princípio só para os funcionários públicos: Torpor.
Consulto o Dicionário Houaiss para saber se é mesmo a palavra certa:
"1- sentimento de mal-estar caracterizado pela diminuição da sensibilidade e do movimento, entorpecimento, estupor, insensibilidade.
2- indiferença ou apatia moral , indolência, prostação
3. (MED.) ausência de reacção a estímulos de intensidade normal.
ETIM: lat torpor/óris entorpecimento, inércia, languidez, preguiça."
E é.
Carlos Fiolhais (in De Rerum Natura)
Consulto o Dicionário Houaiss para saber se é mesmo a palavra certa:
"1- sentimento de mal-estar caracterizado pela diminuição da sensibilidade e do movimento, entorpecimento, estupor, insensibilidade.
2- indiferença ou apatia moral , indolência, prostação
3. (MED.) ausência de reacção a estímulos de intensidade normal.
ETIM: lat torpor/óris entorpecimento, inércia, languidez, preguiça."
E é.
Carlos Fiolhais (in De Rerum Natura)
Para quem não saiba ou se tenha esquecido...
Liberdade de expressão e informação
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
(Artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa)
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
(Artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa)
domingo, 24 de outubro de 2010
Novas mentiras
(Luís Capucha - foto retirada do site Fundação Telecom)
Vale a pena ler a entrevista que o director da Agência Nacional para a Qualificação, Luís Capucha, deu ao jornal Público acerca do programa "Novas Oportunidades".
Está lá tudo esclarecido: desde o desconhecimento se este "ensino" é mais caro que o regular, até ao admitir que é possível alguém passar do 6º para o 12ºano em poucos meses.
O discurso utilizado é invariavelmente o que os socialistas usam quando falam de escola, outra coisa não seria de esperar, mas o que é verdadeiramente surpreendente é que esta gente não tenha o mínimo pudor em repetir num jornal as asneiras clamorosas com que estão a enterrar o ensino em Portugal.
Prova que no mundo de pessoas como Luís Capucha, só existe o eduquês e a sociologia da batata.
Não foi por acaso que a ex-ministra Maria de Lurdes Rodrigues o escolheu para o lugar.
Em 23/10/2010
David Levy no Blogue Lisboa Te - aviv
De mentira em mentira até chegar o FMI
( JN de hoje)
Quando Sá Carneiro morreu no ainda misterioso acidente de Camarate, abriu--se diante de Pinto Balsemão o labirinto habitual da política portuguesa: ele era o sucessor natural, mas a complicada teia das ambições, invejas e traições, dentro e fora do seu partido, não lhe deu sossego. Balsemão foi vencendo as conspirações, mas acabou por se demitir. Aí nasceu a célebre frase de vitória em vitória até à derrota final.
Ocorre-me a lembrança a propósito do Orçamento para 2011, que não me atrevo a analisar como especialista (que não sou), mas que seguramente vou amargar como aposentado neste Portugal financeiramente amordaçado (assim escreveria, noutros tempos, o patriarca Soares).
Também agora poderemos dizer que vamos de mentira em mentira até à bancarrota. Ainda há pouco mais de um mês, o ministro das Finanças (que desilusão!) garantia que as contas seguiam em linha com o previsto, ao mesmo tempo que o primeiro-ministro (que confirmação!) vociferava contra aqueles a quem chamava catastrofistas ou alarmistas, consoante a arrogância do momento. Era o tempo em que Portugal chegou a ser chamado por Sócrates campeão europeu do crescimento...
Foi por este caminho de falsidades que os portugueses foram conduzidos ao maior suplício dos tempos modernos. Aprovem lá o Orçamento, abram as portas ao FMI - mas não deixem sem castigo (político e não só) os responsáveis por estes crimes
Nota do Zé da Silva: Apoio o castigo dos responsáveis. Sejam eles quem forem!...
A Avaliação Externa das Novas Oportunidades
Mesmo num país em que a tolerância tem a elasticidade das conveniências dos seus corifeus, muito me admiraria que um estudo encomendado pelos próprios interessados para dar um determinado resultado o contrariasse.
Por outro lado, que interesse teriam os beneficiários das Novas Oportunidades em dizer mal de uma formação que transveste ignorantes em sábios, enquanto o diabo do oportunismo esfrega um olho? Ou dito de outra maneira, em morder a mão que lhes deu um presente, ainda que envenenado, por saberem no íntimo das suas consciências que foram joguetes de uma viciada estatística para aumentar o número de portugueses prontos a tomarem de assalto as universidades tirando, por vezes, como foi denunciado recentemente nos media, o lugar a estudantes do ensino regular?
[...]
Quanto a mim - com o peso da responsabilidade de ter tecido, naquilo que tenho como dever de cidadania, vários textos críticos sobre esta temática - , as Novas Oportunidades são um insulto de uma sociedade medíocre que mais não pretende que ampliar essa mediocridade aos seus cidadadãos e cidadãs para não sofrer o peso da solidão.
Nada disto seria, assim, tão grave, como é, se não servisse de um mau exemplo para os nossos jovens do ensino secundário que desperdiçam energias em ingentes tarefas escolares num percurso de 3 anos lectivos de sangue, suor e lágrimas para obterem um diploma que, sabemos agora, mais não vale que os cinco réis de mel coado de uma equivalência a seis meses de Novos Oportunismos.
Ora,um estado que despende balúrdios com escolas estatais de ensino secundário para fazerem o mesmo que as Novas Oportunidades (com formadores mal pagos e vítimas de instabilidade contratual) deverá ser responsabilizado pelo mau uso que faz dos dinheiros públicos, os nossos impostos. Impostos que muito se irão agravar num próximo ano de grande sacrifício para as famílias portuguesas que passarão a ser prejudicadas por tectos mais baixos no que respeita a despesas do âmbito da educação dos seus filhos para efeitos de IRS.
Todo este circo pode ser sintetizada neste excerto de um texto de Mario Perniola, professor de Estética da Universidade “Tor Vergata" de Roma. Escreveu ele:
”Os fautores da tradição, que apelam para os valores, para o classicismo, para o canôn, são postos fora do jogo por esses funâmbulos, esses equilibristas, esses acrobatas, que também querem ser eternizados no bronze e no mármore. E quem diz que o não conseguem? Há sempre uma caterva de ingénuos prontos a escrever a história da última idiotice, a solenizar as tolices, a encontrar significados recônditos nas nulidades, a conceder entrada às imbecilidades no ensino de todas as ordens e graus, pensando que fazem obra democrática e progressista que vão ao encontro dos jovens e do povo, que realizam a reunião da escola com a vida”.
Ora, como nos ensina a sabedoria popular, "nas costas dos outros lemos as nossas". Não será altura, portanto, de meditarmos, os seus responsáveis e todos nós, sobre os funestos efeitos de uma pretensa "obra democrática e progressista" que nos querem impingir, à viva força, e que mais não é do que querer fazer passar o gato por lebre? Refiro-me, é óbvio, às Novas Oportunidades!
Por Rui Baptista (De Rerum Natura)
Excertos seleccionados por Zé da Silva
Por outro lado, que interesse teriam os beneficiários das Novas Oportunidades em dizer mal de uma formação que transveste ignorantes em sábios, enquanto o diabo do oportunismo esfrega um olho? Ou dito de outra maneira, em morder a mão que lhes deu um presente, ainda que envenenado, por saberem no íntimo das suas consciências que foram joguetes de uma viciada estatística para aumentar o número de portugueses prontos a tomarem de assalto as universidades tirando, por vezes, como foi denunciado recentemente nos media, o lugar a estudantes do ensino regular?
[...]
Quanto a mim - com o peso da responsabilidade de ter tecido, naquilo que tenho como dever de cidadania, vários textos críticos sobre esta temática - , as Novas Oportunidades são um insulto de uma sociedade medíocre que mais não pretende que ampliar essa mediocridade aos seus cidadadãos e cidadãs para não sofrer o peso da solidão.
Nada disto seria, assim, tão grave, como é, se não servisse de um mau exemplo para os nossos jovens do ensino secundário que desperdiçam energias em ingentes tarefas escolares num percurso de 3 anos lectivos de sangue, suor e lágrimas para obterem um diploma que, sabemos agora, mais não vale que os cinco réis de mel coado de uma equivalência a seis meses de Novos Oportunismos.
Ora,um estado que despende balúrdios com escolas estatais de ensino secundário para fazerem o mesmo que as Novas Oportunidades (com formadores mal pagos e vítimas de instabilidade contratual) deverá ser responsabilizado pelo mau uso que faz dos dinheiros públicos, os nossos impostos. Impostos que muito se irão agravar num próximo ano de grande sacrifício para as famílias portuguesas que passarão a ser prejudicadas por tectos mais baixos no que respeita a despesas do âmbito da educação dos seus filhos para efeitos de IRS.
Todo este circo pode ser sintetizada neste excerto de um texto de Mario Perniola, professor de Estética da Universidade “Tor Vergata" de Roma. Escreveu ele:
”Os fautores da tradição, que apelam para os valores, para o classicismo, para o canôn, são postos fora do jogo por esses funâmbulos, esses equilibristas, esses acrobatas, que também querem ser eternizados no bronze e no mármore. E quem diz que o não conseguem? Há sempre uma caterva de ingénuos prontos a escrever a história da última idiotice, a solenizar as tolices, a encontrar significados recônditos nas nulidades, a conceder entrada às imbecilidades no ensino de todas as ordens e graus, pensando que fazem obra democrática e progressista que vão ao encontro dos jovens e do povo, que realizam a reunião da escola com a vida”.
Ora, como nos ensina a sabedoria popular, "nas costas dos outros lemos as nossas". Não será altura, portanto, de meditarmos, os seus responsáveis e todos nós, sobre os funestos efeitos de uma pretensa "obra democrática e progressista" que nos querem impingir, à viva força, e que mais não é do que querer fazer passar o gato por lebre? Refiro-me, é óbvio, às Novas Oportunidades!
Por Rui Baptista (De Rerum Natura)
Excertos seleccionados por Zé da Silva
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Matar os sonhos para alimentar os mercados
Se há coisa que, de tão confrangedora, se tornou, já, insuportável é assistir a discursos políticos moldados à tirania dos mercados.
Mercados para aqui,
mercados para ali,
é preciso dar sinais claros aos mercados,
cuidado que os mercados estão à espreita,
temos de sossegar os mercados.
Em suma: os políticos, em Portugal e, de uma forma geral, no Mundo civilizado, transformaram-se em marionetas dos especuladores, paus-mandados dos cérebros proeminentes que iluminam as agências de rating. Acordam a pensar nos índices bolsistas, adormecem atormentados pelos juros da dívida. A política perdeu, irremediavelmente, a batalha para a economia. Podemos culpar a crise, mas devemos culpar, sobretudo, a política.
[...]
Em Portugal, servir a população, cumprindo o dever de alcançar o bem público, é não atacá-la em demasia. Não nos darem más notícias são boas notícias. Mas num momento em que os portugueses mais precisam que lhes falem ao coração, assistimos com tristeza, e não com surpresa, ao aniquilamento das pessoas em detrimento dos mercados.
As decisões já não parecem ser tomadas porque vão favorecer-nos ou prejudicar-nos, mas apenas tendo em conta o impacto nos mercados. O ataque sem precedentes aos orçamentos familiares que este Governo patrocinou (um casal da classe média com dois filhos, por exemplo, vai transformar-se pura e simplesmente num escravo da máquina fiscal) é sintomático.
Matam-se os sonhos de milhões, mas mantém-se bem alimentada a voracidade do mercado.
No fundo, como se as pessoas só existissem para lhe dar a comida à mão, acariciá-lo no dorso e confortá-lo: "Não te preocupes, eu posso passar fome, mas a ti não te faltará nada".
E diz cá o Zé da Silva: Alberto Pimenta, vem fazer o teu discurso (não ao Pedro, claro)
Descobri o simplex
Tenho mais medo de entrar numa repartição de Finanças ou da Segurança Social do que no consultório do dentista. Por isso, quando entrei na Segurança Social para pedir um documento a provar que não devo nada a ninguém, até tremia. Tirei a senha e, oh alegria!, era a senha 35 e já iam na 14, não devia demorar muito.
Nem valia a pena sentar-me, fiquei encostada à parede a olhar para os que iam chegando, e tirando senhas, e suspirando.
Quando, hora e meia depois, ainda se continuava na senha 14, comecei a não achar graça.
Reparo então - tenho pouca prática destas coisas - numas senhas com a designação de "prioritárias". Pergunto quais as prioridades que abrangem - mas ninguém me sabe responder.
De repente, num ecrã em que passa muita informação a correr, com toda a gente a sorrir muito, a dizerem-nos - a nós, que já ali estamos há horas - como tudo agora é fácil e rápido, descubro que basta uma pessoa ter mais de 65 anos para usufruir dessa benesse.
Tiro outra senha, desta vez a 20, quando já estavam a chamar a 10. Óptimo, agora é que era.
O pior é que se estava na hora do almoço - e ,durante mais de uma hora, nenhuma senha mexeu.
Palavra que temi um levantamento popular. Uma senhora começou a fazer um comício às massas, "devíamos era ir com panelas a São Bento!", mas como a maior parte não estava a perceber o que faziam ali as panelas, ela lá explicou que era uma coisa que tinha acontecido no Chile, mas na sua cabeça as coisas deviam andar um pouco baralhadas porque, dali a momentos, já era a Argentina e as mães da Praça de Maio, e nós que éramos todos uns bananas, que amochávamos tudo. Desiste de esperar e vai embora, ela e mais alguns, e por isso, ao fim de seis horas de ali estar, chamam-me para me informarem que o que eu quero não é com eles.
Deve ser a isto que o nosso primeiro chama o "simplex".
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