(Daniel Oliveira - Expresso - 24 de Outubro)
Está na moda dizer que a rua não pode determinar
as escolhas do poder político. Compreendo o temor, mas era bom saber o que
é isso da "rua". A ideia de que nós elegemos um Parlamento e, a
partir desse momento, tudo o que esteja fora das instituições é indiferente ao
poder é, antes de tudo, pouco democrática. A democracia não se resume, nunca se
resumiu, ao voto. E o País não entra em hibernação entre eleições. As
pessoas reagem a medidas, os governos reagem à reação das pessoas. Há
instrumentos institucionais, políticos e sociais para impedir que os poderes
eleitos entrem em roda livre. É isso a democracia.
Quando os empresários reagiram à proposta da TSU
alguém considerou que o poder estava "na rua"?
Quando, há uns anos,
uma associação patronal encomendou um estudo sobre o novo aeroporto da Ota e o
governo recuou na sua proposta alguém se indignou com a cedência à
"rua"?
Quando o governo negoceia com os parceiros sociais alguém acha
que está a entregar o seu poder à "rua"?
Ou o nojo à "rua"
é apenas uma posição de classe, que considera que o povoléu não tem de se
envolver nas questões políticas através dos instrumentos que a democracia lhe
garante?
Mas a ideia de que a rua não determina a política
não é apenas pouco democrática. É idiota. Claro que, quando "a
rua" consegue, pela expressividade da sua ação, dizer qualquer coisa sobre
um sentimento maioritário da população, ela determina a política. E é
excelente que o faça. É sinal de que a democracia não é um mero ato burocrático
que se exerce de quatro em quatro anos. Foi o que aconteceu a 15 de Setembro.
Ontem, o Congresso Democrático das Alternativas
lançou uma petição
(http://www.congressoalternativas.org/p/peticao-oe-2013.html ) em que apelou
aos deputados para se comportarem como representantes do povo e não como
meros representantes das suas direções partidárias. E pediu que chumbem o
Orçamento. E pediu ao Presidente de República que use o seu direito
de veto e submeta a lei do Orçamento à fiscalização preventiva pelo
Tribunal Constitucional. Em poucas horas, esta petição já tinha milhares de
subscritores. É a "rua"? Sim. O que interessa é saber se esta
"rua" representa a maioria dos portugueses. Caberá aos deputados
fazer essa leitura. Saber se a recusa deste orçamento corresponde a um
sentimento largamente maioritário na população portuguesa. Qualquer pessoa
minimamente atenta, que ande na rua, sabe como responder a esta dúvida.
Alternativas? Têm surgido muitas,
sobretudo relativas à renegociação da dívida (recentemente, as do Congresso e
algumas das propostas apresentadas ontem pelo Bloco de Esquerda, por exemplo).
Faltam as condições politico-partidárias para que elas sejam aplicadas por um
governo com credibilidade democrática. Essa é a outra exigência que espero que
os cidadãos venham a fazer
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