quinta-feira, 7 de julho de 2011

Cortar sempre no Norte


(Manuel Serrão - JN)

 

Todos gostamos de um Governo que seja de "cortar a direito". Passos Coelho e o seu Governo recolheram a maioria dos votos populares seguramente pela intenção anunciada de "cortar a direito" na governação, sem olhar a quê ou a quem. Desde que a troika pôs os seus pés (apetece dizer garras...) em Portugal, sobraram poucas dúvidas do que iria acontecer. Do que precisávamos de fazer, fosse o Governo este ou outro: cortar a direito.

Cortar a direito, directamente nos bolsos dos cidadãos, é o que já nos anunciaram. Cortar a direito nos gastos do Estado, sempre à procura do prometido menos Estado, melhor Estado, é o que todos continuamos com esperança de ver acontecer, mais dia, menos dia.

Como já aqui referi, para esta intrincada missão de "cortar a direito", Passos Coelho (e Paulo Portas...) escolheram muita gente nova, supostamente sem vícios nem preconceitos, prontos para executar a tarefa apenas com os critérios de competência e rigor.




Pelo menos foi assim que "li" a escolha dos ministros independentes para as pastas de onde o "cortar a direito" se esperava e espera que suceda com mais premência. Nas Finanças e na Economia, Obras Públicas e Transportes, mas também na Saúde, temos hoje gente que tem capacidade mais do que evidente para executar com dinamismo e sem tibiezas a espinhosa missão que lhes foi confiada.

Entretanto, esbarramos em duas notícias que nos fazem pensar se o tal "cortar a direito" tão necessário não vai, mais uma vez, acabar no "cortar sempre no Norte", que tem sido apanágio dos governos instalados no Terreiro do Paço.

Refiro-me ao encerramento da linha ferroviária Porto-Vigo e à indefinição quanto à data em que começarão a ser cobradas portagens nas Scut que escaparam à primeira vaga de novas portagens nestas vias.





São dois assuntos em que não gostava de ver o novo Governo descarrilar, logo nos dias seguintes a termos constatado, como o prof. Marcelo enfatizou no seu espaço dominical na TVI, que a regionalização não consta do programa do Governo. Tanto quanto se sabe ou percebe, nem a tal região-piloto aparece contemplada nos objectivos deste Governo para os próximos quatro anos.

Tanto quanto julgo saber, o Governo anterior teria chegado à conclusão que haveria centenas de quilómetros da linha férrea que seria necessário fechar, por falta de viabilidade. Entre as quais se inclui a linha Porto-Vigo.

Por um lado, gostaria de saber por que é que se começou a cortar nesta linha. Nem sequer se pode dizer que é a que estava mais "à mão", porque os cortes são decididos em Lisboa...

Infelizmente, penso que é o inelutável princípio de cortar sempre no Norte, ou no mínimo, começar a cortar sempre no Norte.

É neste ponto que se dá o entroncamento com a introdução das portagens nas Scut. Também quando foi urgente pedir mais sacrifícios aos portugueses para acudir ao mau estado das Finanças Públicas, foi aos do Norte que se começou a pedir que pagassem.

No caso da ferrovia, é indiscutível que a falta de viabilidade da linha recomenda a solução encontrada. Mas para além de questionar por que é que o Porto-Vigo há-de ser a primeira das muitas que vão encerrar pelos mesmos motivos, ainda vale a pena acrescentar que essa falta de viabilidade também se deve ao abandono a que foi votada pela empresa que a gere. Se a linha Porto-Lisboa tivesse tido o mesmo tipo de "modernização" e "manutenção" da linha Porto-Vigo, teria agora os utentes que tem?

Já no caso das portagens nas Scut, embora a promessa inicial esteja falhada, também é para mim claro que deve funcionar o princípio do utilizador pagador.

Desde que não seja nesta versão de que utilizadores somos todos, no Portugal de lés a lés, mas pagadores, desde há meses e para já, somos só os habituais "parolos" do Norte.

É urgente que o Governo de Passos Coelho nos explique de uma forma clara e inequívoca por que é que vai fechar a linha Porto-Vigo antes de fechar outras nas mesmas condições e quando é que em termos de pagamento de portagens nas Scut deixamos de ter portugueses de primeira e de segunda.

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