O primeiro-ministro ficou de olhos esbugalhados quando Miguel Macedo o acusou de "ter muita lata" por citar os dados da pobreza. Mas se a palavra "lata" pode não estar à altura de um debate sobre o estado da Nação, podemos sempre falar em descaramento.
Porque é disso que se trata quando ouvimos José Sócrates dizer que "Portugal alcançou a mais baixa taxa de pobreza de sempre" ou acenar com o "crescimento da economia e a diminuição do desemprego registado".
Um primeiro--ministro que "guia o Governo pelo valor da responsabilidade" devia aplicar esse mesmo princípio às leituras macroeconómicas.
No que à pobreza concerne, os dados do INE referem-se aos rendimentos de 2008, ainda a crise económica estava a levantar voo dos EUA para a Europa. E de pouco me adianta ouvir o primeiro-ministro dizer que a "redução foi particularmente significativa" no grupo dos idosos - mantendo, aliás, a tendência registada desde 2006. Porque não disse aos portugueses que o mesmo estudo coloca em 22,9% o risco de pobreza nas crianças, valor que atinge os 42,8% se analisarmos os agregados constituídos por dois adultos com três ou mais crianças. Imagine agora o leitor quando fizermos as contas com os rendimentos de 2010.
O que nos remete para uma experiência próxima da recuperação - a "retoma" económica. Essa sensação de viajar através de um túnel iluminado no fundo. Mas, como deixa claro o Banco de Portugal, essa luz esfuma-se já em 2011. Porque se é verdade que, este ano, o PIB deverá crescer quase 1%, Sócrates sabe que no ano seguinte voltamos à estaca (quase)-zero.
Com crescimentos de 0,2% não há retoma, há estagnação. No emprego - o primeiro-ministro tem toda a razão quando diz que "os efeitos do crescimento económico sobre o emprego são diferidos no tempo". No rendimento das famílias, que vai cair este ano 1,3% e 0,8% em 2011. No Estado social, porque as condições de vida dos portugueses vão piorar.
Sócrates está cada vez mais isolado na defesa do seu Estado social (onde pára a ideologia socialista?). Porque enquanto o apregoa, os seus ministros-chave - Vieira da Silva e Teixeira dos Santos - delapidam-no.
Joana Amorim (JN)
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