Paulo Guinote
1
de Abril de 2013
Cruzam-se
no momento actual diversas matérias muito sensíveis para a definição do rumo da
Educação em Portugal, em particular no que se refere aos contornos da situação
da rede pública de escolas. Temos negociações em torno do concurso interno e
externo de professores – que são públicas. E temos negociações sobre uma
eventual reconfiguração das fronteiras entre o sector público e privado na
gestão da rede escolar paga (ou subsidiada) pelo Estado – que são privadas.
Gostaria de afirmar que não tenho especial preconceito
contra a iniciativa privada e que acolho, sem grande sobressalto, o princípio
da liberdade de escolha em Educação como algo positivo, desde que a liberdade
esteja associada a informação transparente e não se limite a ser a liberdade
dos mais fortes imporem as suas leis.
Significa isto que não anatemizo uma qualquer solução por meras questões
ideológicas e que faço o possível por basear as minhas posições em factos não
truncados e de fontes de diversas origens credíveis. Algo que, infelizmente,
nem sempre é habitual, em especial num momento em que a luta pelo acesso a
maiores fatias do orçamento do Ministério da Educação e da Ciência (MEC) por
parte de alguns interesses está ao rubro. E em que há distorções grosseiras da
realidade por parte dos que nada querem mudar, mas em especial daqueles que
querem “vender” soluções que apresentam como de sucesso milagroso garantido.
Vou deter-me um pouco nessa agenda conjunta, nem sempre assumida enquanto tal,
de alguns decisores políticos e de certos empreendedores privados que garantem
ter a solução para tornar a Educação mais barata em Portugal.
O embaratecimento da Educação na forma de pensar dos “liberais” que formam a
corte deste Governo passa por
- reduzir o número de professores dos quadros e
- replicar o modelo de gestão de certos grupos privados:
- uma maioria de docentes contratados, com horário completo e baixo pagamento,
- uma minoria nos quadros com uma carreira pouco elástica e
- uma elite de mandantes com o grosso dos privilégios na coordenação e supervisão pedagógica e administrativa das escolas.
Nada disto é desconhecido e já foi testado algures. Num conjunto de
relatórios produzidos em 2011 e 2012 com o apoio da
insuspeita Walton Family Foundation
é possível encontrar conclusões claras sobre o desempenho dos alunos, que é
consistentemente pior (com naturais excepções) nas charter schools
americanas do que nas escolas públicas tradicionais, assim como sobre a
precarização dos vínculos e condições laborais dos docentes como forma de
reduzir os custos globais.
Num relatório sobre o Green Dot, único grupo privado que aceita professores
sindicalizados em Los Angeles as constatações são consistentes com as de outro
estudo da Universidade de Michigan (Equal or Fair? A Study of Revenues and
Expenditures in American Charter Schools de Gary Miron e Jessica L.
Urschel) sobre as finanças das charter schools que apontam
- a diminuição dos encargos com o pessoal docente e
- a redução dos serviços prestados aos alunos
como os meios escolhidos para baixar as despesas, ao mesmo
tempo que se
- aumentam as remunerações com a estrutura administrativa e dirigente dessas escolas.
É este o modelo que o MEC gostaria de aplicar em Portugal e só ainda não o fez
por questões de ordem jurídica. E é um modelo aplaudido com ambas as mãos pelos
grupos que anseiam aceder à gestão das escolas públicas, acabando de vez com
uma gestão feita a partir de dentro dessas escolas.
O que interessa é ter a maioria dos docentes em exercício estacionados fora dos
quadros ou nos primeiros escalões, com carga lectiva no máximo e um número
muito reduzido a partir de meio da actual carreira. Uma estrutura piramidal e
hierárquica em que uma estreita minoria recebe compensações extraordinárias
pelos cargos de topo. Tudo com um modelo de gestão unipessoal, baseado na obediência,
em que os orçamentos passam a ser por “unidade de gestão” e em que os
administradores (esqueçam os directores) terão crescente autonomia sobre a
contratação ou despedimento do pessoal.
Atendendo a isto, os concursos – em especial o nacional – são chatices que urge
acabar a breve prazo. O deste ano vai servir essencialmente para consolidar o
emagrecimento dos quadros com milhares de vagas negativas e a contabilização,
como se ficassem no activo, de centenas ou milhares de docentes a quem se vai
atrasando a atribuição da aposentação. O objectivo não é suprir as necessidades
das escolas mas consolidar a precarização docente e a redução dos quadros.
Acessoriamente, haverá cálculos e estudos feitos à medida para demonstrar que
há escolas privadas que conseguem fazer o mesmo com menos dinheiro, exactamente
porque este é o seu modelo de negócio, digo, de gestão. Sendo que os interesses
privados estão impacientes, pois acham que já se passaram dois anos e ainda não
tiveram a compensação esperada.
O resto… enfim… o resto é nevoeiro, ao serviço da domesticação e empobrecimento
do grupo profissional qualificado mais numeroso do país e no âmbito dos
funcionários do Estado
.
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