Alberto Gonçalves
O fim da linha
As divergências entre o programa eleitoral do partido no poder e o Programa de Estabilidade e Crescimento já foram enxovalhadas por toda a gente. Toda? Não. Uma pequena parcela da população, vulgarmente conhecida por PS, resiste a admitir a fulminante incoerência de ambos os documentos. Não convém contrariá-la, já que o espectáculo que proporciona é singular.
Se antes o investimento público era essencial no combate à crise, agora a redução do investimento público é essencial no combate à crise.
Se antes o TGV era indispensável ao desenvolvimento do País, agora o adiamento da maioria das linhas de TGV previstas é indispensável ao desenvolvimento do País.
Se antes não se podia aumentar os impostos, agora é imperioso aumentar (indirectamente) os impostos.
Se antes a limitação dos benefícios fiscais no IRS era inviável, visto que prejudicava a classe média, agora essa limitação é desejável, visto que só prejudica a classe alta.
Se antes era urgente promover a melhoria sustentada dos salários reais da função pública, agora urge congelar os salários. Etc.
Ver socialistas e aficionados repetir estas coisas de cara séria é entrar numa dimensão até aqui ignorada da retórica política. Por norma, os políticos mentem. O que o PS faz não é mentir, acto que pressupõe no mínimo um interlocutor enganado. Este PS não engana ninguém: não é possível uma pessoa normal engolir inadvertidamente contradições tão evidentes.
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Habituados a esperar do Estado a salvação, os portugueses descobriram-se subitamente sozinhos, logo indiferentes a um Governo que nas sondagens consideram mau sem considerar a hipótese de o remover. Não é apenas uma questão de não imaginarem alternativa ao PS: os portugueses não imaginam alternativa ao seu futuro, se é que, na escuridão, ainda imaginam um. TGV à parte, aproxima-se o fim da linha. Ou, em tom menos apocalíptico, o do regime.
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Quinta-feira, 11 de Março
A artista é uma boa artista
Ao que julgo, as correntes audições na Comissão Parlamentar de Ética deveriam ajudar a esclarecer um único ponto: houve uma tentativa do Governo para controlar os media? Após o desfile de inúmeras personalidades, estamos cabalmente esclarecidos, mas sobre a extravagância do exercício: a conclusão a retirar da Comissão de Ética é o respectivo e definitivo encerramento.
Não é que, como entretanto se tornou consensual, aquilo não sirva para nada.
Mário Crespo aproveitou para promover o seu livro de crónicas.
O rapaz do PS que se demitiu da PT evocou o avô enterrado com a bandeira do Futebol Clube do Porto.
Os convidados que, sabe-se lá porquê, aceitaram o convite contaram, com credibilidade diversa, a sua versão da história ou histórias.
E sobretudo Inês de Medeiros mostrou-se ao mundo.
A deputada do PS, que era actriz em filmes que ninguém viu, alcançou finalmente certa fama nas sessões da comissão, através de prestações sorridentes e, ao que percebi, mudas.
Embora secundário, o desempenho chamou a atenção da Sábado, que a chamou para o papel principal numa entrevista, também disponível em som e imagem no site da publicação.
Aí, a sra. Medeiros prova abundantemente o talento que Deus lhe deu.
Sobre as viagens semanais a Paris, entende que os contribuintes a devem financiar na medida em que, cito, vai lá fazer compras e confirmar se os filhos fizeram os trabalhos de casa (e depois ri-se imenso).
Sobre os subsídios que recebeu da PT (por intermédio de Rui Pedro Soares) e da REN, encolhe os ombros e confessa relativa amnésia (e depois ri menos).
Sobre o eng. Sócrates ter mentido ao Parlamento na história da TVI, acha que a mentira "não é assim muito grave" (e depois volta a rir com gosto).
Inês de Medeiros desperdiçou anos em dramas quando o seu génio propicia naturalmente a comédia. Só é pena que estas saiam directamente em vídeo.
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(publicado no DN de hoje; os realces são de Zé da Silva)
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